domingo, 18 de março de 2007

cinzas de guerra (ou metrópole)

os arranha-céus eram vias
dum labirinto obscuro,
onde cada luz é um erro
e nunca se volta um passo.

de repente, se moviam
os corpos, incertos.
havia um desespero
no despropósito.

que se escondia
por trás dos olhos
cinzentos e vermelhos?
acaso sonhariam
outras paragens?

suspensos no universo
olhos e pés (pulsavam,
apenas) perdidos no espaço.

sábado, 17 de março de 2007

como se fosse de verdade


toda vez que encosto na pena sinto um calafrio, como pressentindo uma desgraça, ou coisa assim.

é como se já soubesse que cada palavra (e cada espaço em branco) já não têm sentido algum... não me levará a nada, não transmutará em esperança essa perda toda que tenho ainda por sentir nos ossos e nos lábios.

há um quê de podridão no sentimento, como que sempre e mais desgastado.

...

acho que não me encontro por pura idiotice... ou bom senso.
nunca se sabe o que o espelho realmente diz às nossas almas, sussurrando nos olhos verdades escondidas.
provável é que eu sempre suspirarei a pergunta, nas horas fugidias da escuridão, embaçando ainda mais as vidraças da janela:

quem sou eu, além do desespero dessa face?
e eis que sucumbirei novamente, a me derramar pelo chão, como poeira incômoda que o tempo não leva embora, até perder de vez a vista da paisagem, que placidamente observa, indiferente na verdade, minha tão frustrada egogonia...
que fizeram os homens para sentirem tremendo pesar?
conquanto fosse água, essa vazia coisa que passa e muda como bem entende, tudo seria diferente.



*foto http://membres.lycos.fr/cinephilia/hamlet/hamlet2.html

terça-feira, 13 de março de 2007

vagações

nas cidades, madrugadas.
e almas engarrafadas
em blocos de vidro e aço.

balançavam entorpecidas
num caminho tortuoso.
desdobrava-se o tempo
num sempre sem fim
- sulfuroso.

amontoadas, amorfas,
esquecidas de si mesmas...
onde parar os pés
ou a vida?

domingo, 11 de março de 2007

confissão.


em fim me deparo com a verdade que mais me dói. essa verdade de nunca ter dito nada meu. tudo que foi e fui, roubei. não havia palavra alguma que meu espírito soberbo e calejado proferisse por si só. não havia sonho, nem poesia. não havia amor. não havia nós. nada havia senão a dor. essa sempre tava lá. e ali, em toda e qualquer parte. por isso não é minha tampouco.

a noite, falo dela, mas é ela que diz. o pássaro não carece redizerem-lhe as palavras. nunca ouvi mesmo o vento - e a sua voz me faz falta. e as linhas e os pontos e os sinais inúmeros e incabíveis e as reticências congênitas e pútridas e aquele beijo, nada nada nada nada nada e tudo. nada era eu, a bem da verdade.

e eu que achava que sempre e mais me encontrava, mais me perdia, nessa coisa besta de perfilar bobagens em versos.

até acho que versei eu mesmo uma vez ou duas talvez. mas foi minha sombra inimiga que tocara o papel. jurei o desdito e chorei (de mentira?) a promessa que não cumpri.

e quando eu me for, o papel fica. fica, mas nem o papel é meu. e há de apodrecer na clandestinidade das idéias, nos subúrbios da razão e da verdade, e em metadezinhas míseras e impróprias essa parte já tão descabida de mim...

há de expirar desse mundo essa parte de minha mente tão logo eu também daqui suma.em síntese, ninguém nunca dá valor.
nem mesmo eu.

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*não me vejo meus traços nas faces de meus filhos...
na verdade, não vejo traço de coisa alguma.

foto: http://oneyearbible.blogs.com/photos/uncategorized/broken_mirror.jpg

sábado, 10 de março de 2007

de última hora



faz tempos que o silêncio emudeceu.
não sussurra mais meios termos
às meias noites...

nunca mais,
na imensidão dessa hora,
me soprou o vento
lástimas novas.

não cantou do poente
o sol vanglorioso em vermelho
que agonizava calmamente.

o luar serrilhou a montanha
bem ao meio, crescente.
e minguou em seguida.
sumiu - displicente.

secou nos meus olhos
o último grão de areia
da última onda da praia.

a mão tocou a falta
que se fazia indigente
aos pés da cama.

pressenti no espasmo...
...sumiste.
- ou era um sonho?
brandura nos meus braços?

foste esquiva, noite a dentro.
nada disse ao meu destino.

desiludido na escuridão
dessa certeza absoluta,
estou coberto em luto negro.
- mas ainda em vigilha te espero.