quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

nota de falecimento

vô deitou-se pra abraçar a eternidade
vovó, cambaleou. seu corpo fraco
quase não era corpo, era alma pura.

ela de corpo mirrado, de feições já corroídas
pelas longas esperas dessa vida...
espera um reencontro - mais um.

vovó não é feita de carne.
se fosse, tinha desmanchado hoje.
aquilo é pedra bruta.

mas que não se esqueça:
pedra também chora
e quando chora, sempre brota um rio.

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vô, desculpa a distância, e a falta de uma despedida.
mas o que fazer se o senhor parte de surpresa, de um dia pro outro, sem dar explicação nenhuma? talvez não seja das perdas a mais cruel, cê foi um grande cara, grande exemplo. família grande criada na base do cimento e tijolo, por longo tempo.
lembra que vó te ensinou a escrever dereitinho? você já foi tão jovem... como eu.
dominó todo dia, lembra? lembra e guarda: cê era o melhor (pau a pau com vovó).
lembra daí que daqui eu também me lembrarei sempre do sorriso de dentadura, o chinelo velho, a faca de picar tabaco, o carinho, a ternura...
chorar, dizem, é até bom. mas acho que devia mesmo era bater palmas, cara com a maior raça que eu já conheci.
abraço. fica em paz. sentiremos saudade.
até qualquer dia.