canto pra falar do nada
pra dizer tudo
em coisa alguma.
pontos de luz na treva
ou pontos de treva na luz?
porto pras minhas palavras
singelamente plurais e (im)puras.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
nota de falecimento
vovó, cambaleou. seu corpo fraco
quase não era corpo, era alma pura.
ela de corpo mirrado, de feições já corroídas
pelas longas esperas dessa vida...
espera um reencontro - mais um.
vovó não é feita de carne.
se fosse, tinha desmanchado hoje.
aquilo é pedra bruta.
mas que não se esqueça:
pedra também chora
e quando chora, sempre brota um rio.
------
vô, desculpa a distância, e a falta de uma despedida.
mas o que fazer se o senhor parte de surpresa, de um dia pro outro, sem dar explicação nenhuma? talvez não seja das perdas a mais cruel, cê foi um grande cara, grande exemplo. família grande criada na base do cimento e tijolo, por longo tempo.
lembra que vó te ensinou a escrever dereitinho? você já foi tão jovem... como eu.
dominó todo dia, lembra? lembra e guarda: cê era o melhor (pau a pau com vovó).
lembra daí que daqui eu também me lembrarei sempre do sorriso de dentadura, o chinelo velho, a faca de picar tabaco, o carinho, a ternura...
chorar, dizem, é até bom. mas acho que devia mesmo era bater palmas, cara com a maior raça que eu já conheci.
abraço. fica em paz. sentiremos saudade.
até qualquer dia.
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
da penumbra
silenciosamente alçados nas montanhas.
algo há de irromper no horizonte.
algo que não aquece, não conduz
como a luz que se havia de antanho.
as estrelas estremecem e a terra desaba.
quê corre no céu com tamanho fulgor e volúpia?
há um toque de desejo desavisado
que fere o sangue e torpe se insinua.
a lua branca há de romper aurora?
não é a lua. mas como brilha essa tua hora?
será que se lançou na meia-noite?
perdeu o príncipe, o sapato, a cabeça?
perdeu o senso e o sono no tempo
onde jazem as flores do campo?
a noite é inteira taverna e manjedoura.
cativando penumbras ardentes de sonho
e impudentes de injúrias, na alcova.
um cisco risca o teto medonho e escuro.
pontua uma claridade distante e some...
a passo largo, leva embora o acaso e a esperança.
quarta-feira, 7 de novembro de 2007
mutuo
é, pois, a hora morta de viver
tocar a chama do mundo
morder a carne da verdade crua.
tempo, não me prende agora!
e alonga também um pouco essa tarde
que se despede calidamente
no azul enegrecido do horizonte.
amor, sentindo toda tua pele nua
arrepiada de segredos sujos
toco seu desejo com zelo impensado
e calo o pudor que em tua alma ardia.
hoje sou aquilo enquanto chuva, fogo, pedra,
tempestade que se perde e alastra
devastando as juras mais imprudentes
e até mesmo, aquelas outras, as mais puras.
solubilidades
idade
indis
tinta nessa tarde ma
cia,
luza mare
lada d
o tempo con
some
até o po
nto
a
final
segunda-feira, 5 de novembro de 2007
do que se transforma
as pernas, os suspiros, o sexo.
tudo solto e desenfreado,
tão natural como o caos.
nunca se guarda uma certeza
por menor que seja
que uma leve brisa de aprazo
não despele e cauterize,
como ferida e cura.
o mundo, pode ser que
com um pequeno pensamento
catalise.
e se (te) transforme
invariavelmente,
numa alucinação
luminosa.
sábado, 20 de outubro de 2007
acolhida
desse meu verbo vagabundo
que eu espalho na noite, moribundo.
ele é cão amansado pelo tempo:
já não morde, já não ladra.
- letra, há penas.
entra, doutor, que a casa é rua.
toma todas as minhas filhas, essas putas
palavras perdidas das linhas certas
que se vendem pelo preço menor,
e abençoam pequenos pecadores.
toma, sinhá, meu sangue nessa travessa.
não repara não, que ele tá manchando
tua prata, tão cara.
mas sai logo, não fica.
carece só um muncado d'água.
repara não, esse fiapo que restou,
essa minha figura pouca e sequíssima
como a peste que alastra.
esses meus pés baços de vento
se movem só na poesia.
logo passam, não param nunca
nos olhos de pessoa nenhuma.
viu que eu já me fui?
sou passado dos seus olhos.
uma lágrima? um escárnio?
um sorriso, talves?
sou nenhum, nem outro:
sou uma breve miragem.
nunca lugar - nem mesmo um.
sou todo passagem.
sexta-feira, 5 de outubro de 2007
entregas - desintegras
todo um sol, rebentando núvens,
quando enlaçamos nossos sorrisos.
quando estou em sua companhia.
sempre levanta uma brisa no peito
fazendo dessa vida inteira alegria.
saberiam lá os pássaros mais jovens
o quão grande era nossa liberdade?
quão alto voavam nossos sonhos?
mas é que sempre vem a noite
sorrateira, confundir os passos.
desatando, num instante, dois caminhos.
seus cabelos, despedindo-se ao vento,
dançavam à beira-mar. cada pegada
cravada na areia setencia a distância.
não sabia eu que era tudo erro,
mal percebia o engano custoso
que construíra com o tempo:
me abandonei em teus braços.
teus braços me abandoram
no esquecimento.
quinta-feira, 13 de setembro de 2007
a transubstância
é a matéria dos sonhos desfeitos
é essa parede branca
a resvalar todo esquecimento
é essa lua branda
a expurgar todos os defeitos
é essa palavra fria
a lacerar todo sentimento
é essa pessoa fina
a vagar curso incerto
essa lágrima amarga - e clara
como pesadelo mais vivo
que suavemente apaga o sorriso
e docemente dança no meu rosto
retrata tudo que é imperfeito
essa gota de esclarecimento
e é o bem mais sólido que tenho
nesse paço imenso, nessa vida e devaneio
essa lágrima clara, em suma,
sou eu revelado e inteiro
dobrado sob um peso imenso
de um sonho, uma gota, um espelho
-----
a lágrima
é enfim isso que ensina
o fim e a sina
domingo, 9 de setembro de 2007
cala calamidades
que você não disse.
desculpa essa pressa,
que torna tudo tão curto.
me absolve esse devaneio
louco que nunca quis te revelar
e esses traços na parede
que não te deixei riscar.
não me julga pela pedra
que eu joguei pro ar
e caiu nas suas costas
pra tu sozinho carregar.
lamento tantas horas que engoli
no tédio insuportável de te esperar
- afinal, como esperar por ti
que sempre carreguei no meu olhar?
lembro dessa falta de sentido
que nunca permiti
e essa tanta desmesura
que sempre infligi.
olha esse poder grande
que eu sempre tive:
de calar o universo
daquilo que eu nunca proferi.
perdoa, minh'alma,
essa minha tão tola criatura
que no defeito te reflete
impura
nesse mundo avesso
do outro lado do espelho
em que o silêncio te espanta
e me mata.
------
*foi, sei, tola a tentativa
tentar te calar pra suprimir a dor.
tudo fica pior quando não te digo
sussurrando no ouvido
tudo isso quanto for
misto de calor e frio
a vagar no meu mundo
no meu corpo à fora.
segunda-feira, 20 de agosto de 2007
dos deveres
em que o choro pesa,
quando a alma pede clemência
e se perde do peito pio.
deve ser assim que se sente
quando se afoga e agoniza,
erra em tudo aquilo que se tente,
e tudo mais e pouco se esvazia.
deve ser assim no meio de tudo,
quando se perde a calma,
que o medo toma conta
e a esperança vai embora.
deve ser assim que sempre é
deve ser assim porque é preciso
deve ser assim o sentimento do mundo
conciso e confuso no vidro.
deve ser assim que na verdade
sempre me sinto, na vontade
de achar resposta alguma
pra tudo quanto dessentido.
deve ser assim... tormento.
deve ser assim, tortura
a espera da espera pura
que se espanta a todo momento.
para que tudo se consuma
e para que tudo mude
deve ser assim
e assim deve ser
eu sempre
um passo a mais
longe de mim.
__
imagem: http://centelhasdeinfinito.blogs.sapo.pt/arquivo/pegadas%20na%20areia%202.jpg
quarta-feira, 15 de agosto de 2007
íris decaída
meu olhar me despe:
pecador arrependido.
meu olhar se perde:
pensador perdido.
meu olhar permuta
toda dor em fantasia.
meu olhar pergunta:
ainda há alguma ferida?
meu olhar impera
sobre os corpos na rua.
meu olhar persegue
meus anseios terríveis.
e a alma cega grita
palavras invisíveis
que fogem inteiras
ao meu olhar – risível.
e o meu olhar, então,
escondido, irrevelado,
na medida dessa hora
imensa, se despede.
----
*aos meus olhos covardes,
e prepotentes...
sonhadoramente fechados.
foto:
http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/images/1431_storm/5142525_storm12.jpg
quarta-feira, 8 de agosto de 2007
cem poesias
quarta-feira, 1 de agosto de 2007
das verdades (ou da nudez)
um tanto quanto arrependidas
vaidosas e vadias.
perdidas.
minhas verdades morrem de silêncio
um tanto quanto esquecidas
vaporosas e arredias.
inafiançáveis.
minhas verdades caem de vazias
um tanto quanto erradas
sonhadas e iludidas.
irrealizadas.
minhas verdades tortas...
minhas mentiras.
eu inteiro torto e perdido,
encontrado do avesso
nessas verdades nuas.
segunda-feira, 23 de julho de 2007
dor
tem um quê ausente
que em tudo andava antes.
que era aquilo?
que espera...
amargo e longo momento.
minhas palavras de brilhantes,
quando em pouco as perdi?
----
...a poesia não é remédio, como eu achava que era antes...
terça-feira, 17 de julho de 2007
pedraria
que se ergueu em plena madrugada?
foi construída com laço de sangue
em segredo pela aurora fria.
o sol que brota, não mais da montanha,
mas da muralha sombria,
tudo separa e tudo aponta
revelando podre a verdade fina.
suas pedras, seus lamentos,
sua concreta harmonia dissonante e seca,
tudo em volta e dentro da parede
que bota sede na alma sadia.
saciaria alma, se pudesse,
mas alma de pedra não fala
por trás da parede
-esquife eterno de solidão.
amor, viu a última grande muralha?
não se preocupe, não procure, amor.
a muralha não está no horizonte.
-----
andar com teu peso, que tua arma e arremesso
presos no peito, dilacera todo e qualquer sonho.
sai de mim, já não te quero, excedente
peso frio dos meus mortos amigos e amores.
quero de novo meu corpo-pedra
que se não amava, não cantava,
mas também não chorava, não gemia
no sorriso algoz dessa vida.
----
sexta-feira, 29 de junho de 2007
senti-sinestésico-icídio
vejo em tudo sinfonia calada, que se apregoa pelo espaço a fora. e dentro de mim o barulho que quer irromper o tédio, a palavra desvairada que precisa criar, o vício insaciável de escrever nas paredes brancas dessa vida pra ver se encontro na cor da letra o des-sentido da vida.
escrevo para vazar, pra me derramar inteiro nos teus olhos.
até que finalmente me olhe e eu vire idéia ou lembrança.
escrevo porque meu retrato é ransoso e não se satisfaz com o meu sorriso. ele não me tem. é retrato de céu, de árvore, de grama, de criança, de velho, de tarde, de hora, de praça, de mar, de estrela, janela, areia, água de rio e chuva...
e viver, parece que eu percebo, é uma doce vertigem. o des-sentido só, sem motivo, sem razão, sem compromisso: marivilhoso des-sentido, essa não-prisão, essa desnecessidade, esse não-tempo, essa eternidade...
voz sumida a minha.
sumida do mundo: fala ela... ninguém escuta.
diz com a mão, o toque, o calor em mim.
e é prazer e dor tão grande, que parece que vou romper, me rasgar, trucidar-me, acabar, explodir, sumir...
mas nunca, nunca, nunca, nunca morrer.
porque é explosão que ecoa e nunca morre, se debate para sempre nas paredes do quarto fechado.
suspensão
meu rosto não aparece em fotos
meu cheiro sumiu no instante
minha pele apodreceu negra
a alma perece aos poucos
e canta enquanto se desfaz
em doses homeopáticas
milimétricas e sem rima
não existe som no vazio
não existe luz dentro da carne
no cerne do universo
tudo cintila somente
lamuriosamente
como prestes a acabar.
não existe pergunta que não se cale
perante o segundo que se encerra
atrás das véias saltadas dos prédios
das pontes, dos telhados, das contruções.
a orquestra suspensa dos sonhos
sempre fingindo que tudo sabem
espertos que são.
mas no salto tudo voa, desprende,
esvaece
não resta ao menos o ponto
até que o poema toque o chão
.
quinta-feira, 21 de junho de 2007
onírico
caminhar com pés de núvem.
respirar a brisa púrpura
e sangrar o sorriso branco.
sonhar pra escapar da dor
sonhar pra catar a flor da vida
sonhar para surgir a dúvida
sonhar pra semear poesia.
cantar pra dizer o sonho
com o espírito rouco,
e na virada da quina da hora
pra distrair o tempo pouco.
sim, sonhar!
blasfemar a verdade cinza
navegar esperanças
quebrar barreiras de vento.
sonhar e acordar
para não se perder,
para frasear,
fazer o ponto,
e montar a reticência
que se estende aguda
e segue aflita na espera
de suspender o pé do homem.
quarta-feira, 13 de junho de 2007
totalidades
o tudo é parte alguma.
todo o tudo é cada parte,
que leva do nada à solução
nenhuma.
se, contudo, tudo é cada coisa,
tal é como se tudo fosse uma:
uma coisa meia certa,
meia parte, meio oculta.
tudo é um pouco nada,
- e nada adianta isso tudo:
tem ainda todo um resto
de parte, numa outra metade.
nunca tudo é tão distante
de tudo, em instante.
sempre e longe, de tão perto,
tudo oco e o todo nada.
terça-feira, 12 de junho de 2007
semi-obituário
pelo meu sensível e insensato silêncio.
volto aqui com a certeza
que não tenho mais,
de que o sol quebrará por certo
a treva errônea dos meus medos.
é que cá tenho o lirismo meio esfrangalhado,
doente terminal de mim mesmo.
doente de alergia, de abandono,
de tédio e de clausura.
e por fim, constado é, senhores,
o mal que consome:
eis que tudo me agoniza
pela falência múltipla
dos sonhos (findouros).
----
ele agonizava e não entendia, porque não queria entender. até que um belo e terrível dia, teve coragem: olhou no espelho. viu a si mesmo, tal como era, tal como fora, tal como, na verdade, sempre seria. indignou-se, botou o pé no teto do rancor, afogou-se. depois chorou. depois cansou. reergueu-se, mais fino e mais pálido do nunca. tacou muito dignamente a pedra no espelho: partiram-se ambos, tal como ele esperava, o espelho e a alma. virou de costas, retirou-se de si mesmo. foi modelar-se, ele sabe onde, num futuro não sei quando, com a mão trêmula de incertezas, caminhando com os pés firmes e podres, enraizados no chão.
sexta-feira, 25 de maio de 2007
brevidades
e a minha vontade de vidro.
nunca sei se fico inteiro
nesse fio de voz fina,
que se espelha no espaço.
eis o meu sussurro itinerante
que sempre se perde no instante
e no tempo transita mágoas,
poemas e alegrias pálidos.
jaz aqui meu sopro ausente
que some tarde da noite,
no meio do dia,
entre o desespero
e o esquecimento.
está aqui o que eu era,
o que sempre erra na vida
e no sonho prospera
- esse sonho que finda.
eis-me em chamas consumido.
da memória do mundo, perdido.
inevitavelmente, eis que daqui me parto
ainda que, deveras, nunca tenha chegado.
terça-feira, 22 de maio de 2007
irracional e irresoluto
tenho asco. tenho sede. tenho saudade. tenho medo.
não tenho força (e, sim, como me dói constatá-lo, sou fraco e patético).
não me tenho, não mais, pelo menos.
a chama que antes me aquecia cálida, está bruxuleante, como em vendaval mortífero: a chama balança louca desvairada e insana, quer sumir.
a razão, que já perdi há tempos, dela me esqueci...
...
não tem mais nada que vale a pena dizer, por enquanto dure essa merda de nó na garganta da alma podre.
no mais tenho vontades, nada mais.
*desesperadamente deprimido e inquieto.
sábado, 21 de abril de 2007
uma canção por fazer
que na aurora dourada fez moradia;
das carícias dum Sol profundo se fez,
e nas noites de prata ele ardia.
um sonho de cantar toda e cada nota
em cada espaço de espanto que ouvesse
no tempo da vida suave.
soaria o sonho em cada e toda esquina
de vento que leve mais longe o encanto
até pro menino da calçada ao relento
até nos berços eternos, as covas,
ou os berçários e os varais e os jardins.
e nas tardes carmins, sem demora,
põe-se o sonho a tocar os lábios
na sabida e ávida face da distância,
que se deita macia, e me faz te encontrar.
e o sonho de cantar alto, de lembrar cada letra
da qual me esqueci, sem nunca ter escutado antes
tal quão doce melodia.
vontade de criar músicas do nada,
da poeira fugidía dos dias,
pra embalar em calmaria
toda essa profuzão de sentimentos
e sentidos confusos.
uma música que bastava ser um assobio,
um sopro, fagulha de alma e sonho,
-a saber, uma letra incontida e criança,
recém desperta no peito do homem só.
uma canção a se fazer no meio do seio da vida
com calma vadia de se escorregar e correr
nos parques e nas curvas do destino.
um tom brando e macio, marcado ao passos
que ressoam nas paredes brancas,
o coração que salta em pulsos cândidos,
enlouquecido pra cantar.
---
o sol bate na janela, e alaranja e enche o quarto inteiro, inclusive o olhar e o sorriso. tô com vontade de cantar... mas sem letra, com calma, sem pressa, suave... quero cantar, mesmo que desafinado, uma vida inteira de sonhos e brisas.
escuto música nos seus movimentos macios, e nos seus cabelos, no seu perfume...
amor já é alegria e canto que me basta....
domingo, 15 de abril de 2007
pro doce olhar duma menina
arrebentei meu peito à sua porta
só pra ver se você se importa...
nessa coisa besta de contar o tempo
me perdi nas horas dos seus lábios
e nada além disso me devora mais...
corro entre o vento e o seu vestido
brincado de carícia com seu veneno
que me mata na felicidade, alento.
nessa plenitude dessa tarde
já aparece tempestade
mas me embriago das ondas
do seu doce mar-amar...
ê, vida cansada no peito de tanto pulsar.
corro entre os morros do nosso leito.
nunca canso de te esperar.
e se é alta a lua ou a hora
que não seja a última a chegar
pra nós dois a alegria desse olhar.
o seu doce toque, meu suor de amor.
juntos nessa tarde, crianças ao tempo
da inocência nua dum brincar.
e já não é sem tempo,
que me arrebata o canto:
para sempre nessa tarde,
sempre e terno, amar você.
------
"que não seja imortal, posto que é chama
mas que seja infinito enquanto dure..."
Vinícius de Moraes
quarta-feira, 11 de abril de 2007
vespertinar
respira brancura espelhada
na água do céu,
rio azul de ponta-cabeça.
de noite, à cima, precipício,
princípio e fim
no vazio estrelado.
os anjos quedam
sem o chão de céu.
sem asas, nem nada...
terça-feira, 10 de abril de 2007
terça-feira, 3 de abril de 2007
despedida incontida
são puros e agora lhe entrego
o poema de sangue rubro
e branco de paz eternecida.
na clareza santa da espera,
essa pútrida mansão dos sonhos,
me despedaço em tom macio
com o toque leve que teu olhar me dera.
não vejo mais, embriagado
em desatino, a distância
tão próxima desse meu horizonte,
que plácido deita-se - a oeste.
é com teu olho d'água
que na noite enxergo,
prevendo as madrugadas
a galgarem os montes.
é com teu olho fechado
que em sono profetizo
o som que há de romper
a aurora:
alma vazia a acorrer socorro.
mas seu esplendor divino
gozava calmaria leve.
calava-se o espírito
(por hora breve)
tão definitiva calmaria
inigualavelmente ardia
invejavelmente sonhava
em tal eternidade dormia
na vaguidão do destino
nunca outra aurora haveria
nunca mais a espera
nunca e sempre, tardia.
os versos que outrora tecia
agora - tão tarde - lhe entrego
na carta de sangue e espera
na noite que não me sorria.
--
pro Bruno
segunda-feira, 2 de abril de 2007
infanticida
faz um tempo,
que o sonho me sorriu.
seus olhos infatis
lembravam-me...
ainda lembro
de mim?
na tortura do tempo
torto:
nu, como sempre fora,
eu nesse momento.
nu e pequenino
menino sonhador
e demente.
desde quando
sei de tudo?
desde de sempre
e por isso sempre desconfiava
desse fio de navalha
(sanguinária)
que é a verdade.
beijo, boa noite, adeus.
derreto-me a toda hora
buscando no sonho
a paz que a vida não deu.
domingo, 18 de março de 2007
cinzas de guerra (ou metrópole)
dum labirinto obscuro,
onde cada luz é um erro
e nunca se volta um passo.
de repente, se moviam
os corpos, incertos.
havia um desespero
no despropósito.
que se escondia
por trás dos olhos
cinzentos e vermelhos?
acaso sonhariam
outras paragens?
suspensos no universo
olhos e pés (pulsavam,
apenas) perdidos no espaço.
sábado, 17 de março de 2007
como se fosse de verdade
*foto http://membres.lycos.fr/cinephilia/hamlet/hamlet2.html
terça-feira, 13 de março de 2007
vagações
domingo, 11 de março de 2007
confissão.
sábado, 10 de março de 2007
de última hora
faz tempos que o silêncio emudeceu.
não sussurra mais meios termos
às meias noites...
nunca mais,
na imensidão dessa hora,
me soprou o vento
lástimas novas.
não cantou do poente
o sol vanglorioso em vermelho
que agonizava calmamente.
o luar serrilhou a montanha
bem ao meio, crescente.
e minguou em seguida.
sumiu - displicente.
secou nos meus olhos
o último grão de areia
da última onda da praia.
a mão tocou a falta
que se fazia indigente
aos pés da cama.
pressenti no espasmo...
...sumiste.
- ou era um sonho?
brandura nos meus braços?
foste esquiva, noite a dentro.
nada disse ao meu destino.
desiludido na escuridão
dessa certeza absoluta,
estou coberto em luto negro.
- mas ainda em vigilha te espero.
terça-feira, 20 de fevereiro de 2007
dúvida-prisma
atrás do verso
dessa folha?
---------
*me sinto estranho por esses dias...
como um menino bobo sem saber o que move as núvens, como floresce o dia ou brota a noite na janela, depois do fascínio enevoado da alvorada...
as árvores não param de sussurrar uma melodia desconhecida.
a água que flui pelos meus dedos, some antes de me dizer um motivo de qualquer coisa.
o verde da mata, que mancha meus olhos, não me trás também resposta alguma.
o vento sibila alguma profecia em menor tom... não entendo direito o que ele diz.
e a estrada, imponente, perante os meus pés tão pequeninos, me ameaça com um olhar morto.
(será que ela leva a algum lugar?)
o que andará atrás daquele monte? como posso tocar o horizonte distante, se ele sempre me escapa?
como posso eu , por Deus, querer poder alguma coisa???!!
afinal, não sei ao menos se ainda existo.
tenho muitas dúvidas nos olhos, e muitas lágrimas loucas, prestes a nunca serem derramadas.
segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007
domingo, 18 de fevereiro de 2007
póstumo
peço de volta aos céus
minha alma que levou o vento
no ventre da terra jaz meu corpo
podre ao sabor do tempo.
minhas memórias corroídas
as finas retinas desalinhadas
a ausência do nunca
me toma os lábios
o peito encardido
surrado, vadio...
nada a guardar.
coração despedaçado
nem carece de abrigo.
as mãos tocam ligeiras
as nuvens de algodão
além das trevas.
nem tudo está perdido,
nada além da sanidade
ou do sentido
esvaeceu.
só não há de sumir o tédio
nem a dor, nem a saudade,
nem a vontade louca
de pular do prédio.
construção de concreto chamada vida
insensatos que são seus andares
e corredores e moradores
e suas tardes modorrentas.
há sempre um salto
por trás de cada janela.
um salto e uma queda
(eterna).
terno e para sempre
de asas abertas.
---------
*imagem:
http://fotogui.blogs.sapo.pt/arquivo/Janela-A.jpg
sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007
pós tu amor
de dizer te amo todo dia,
depois dessa brisa boa,
dessa alegria,
depois dos anos juntos,
um ao lado do outro,
depois da rosa em broto
que eu sempre lhe trazia,
depois dessa coragem
de ser sem-vergonha,
e de falar bobagem
e contar estrela,
depois de andar na grama
com os pés descalços,
depois de amar
na imensidão da cama,
depois de jurar
fazer feliz,
depois unir as almas
em pura ilusão...
depois de todo sonho
de toda essa brandura
a dura parede
do desencanto.
rompe a noite
a lua fria
e todo amor
vira lamento.
o canto que se cantava,
o amor que se amava,
a alma que se tocava,
tudo isso morreria.
depois de tudo,
peito em luto.
o que era mel
vira fel nas veias.
a alma agoniza,
o coração rasga
de papel,
como fora todo o resto:
o amor, o aroma,
o coração que ama,
a cama, a alma...
as cartas e os poemas.
depois de tudo,
do além de tudo,
sequidão.
sede sem fim.
o amor jaz entre a relva
sem sempre, nem diamante,
nem palavra de juramento.
o amor se vai sempre.
e sempre é o fim.
quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007
pegadas
de felicidade?
por que voltar
de qualquer parte?
pra que desfazer o sorriso?
na verdade,
talvez não seja
a tal felicidade
o que eu preciso...
o horizonte, parece,
sempre enseja
no peito indeciso
um pouco mais de agonia.
quão vasta a jornada...
quanta treva nos caminhos...
pés palmilham estradas
nunca encontram ninho.
o horizonte que procuro
meus pés nunca hão de tocá-lo.
ele há de morrer no sonho
e na vontade...
no escuro.
cada palmo desse mundo
me leva a um muro
- beco sem saída.
caminhar, pra que isso?
os passos, parecem,
nunca dão em nada!
------
*busca não tem fim
(diferente da alegria).
quem tem fim
é o viajante
que acaba em ossada
jogada no esquecimento,
sem pés,
nem letargia,
nem poesia.
só o pó da longa estrada
- nela ele se eleva
de senhor a hóspede
de eterna morada.
sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007
nem tudo num tampouco
nem toda tristeza é de agonia.
nem toda morte vem da luta.
nem todo amor é fantasia.
viver toda tristeza
não é morrer de fato:
vivendo-se, morre - certeza.
(seja no espera ou no ato).
viver é já mortalha
que visto sem lamento
numa louca batalha
contra o vento.
pois há de vir no vento
o tempo da tempestade
a embalar toda a cidade
em dissonante intento.
a morte há de levar
até as crianças nos braços
mas não tremo em constatar
na vida semelhante traço.
se na calma pressinto a peste
"verdade" sei que essa se chama.
velas ao leste!
quero tocar do sol a chama.
tocar, sentir queimar
antes que tudo se perca
em meio a vento e a poeira.
em meio a papel e a solidão.
pois não há cerca
pro meu descompasso,
nem mínima razão
pr'essa loucura.
quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007
terça-feira, 16 de janeiro de 2007
orquestra sincrônica
em que o tempo me ouvia.
hoje, nada escuta.
grita
nos meus ossos.
e eles,
mudos,
obedecem.
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a vida é uma orquestra
sincronicamente armada
até os dentes
de agulhas.
essas agulhas se chamam
segundos.
furtividade
a testa pulsando na palma
a testa pulsando na alma
a alma pulsando sem calma
a terra ruminando a lama
a lama suja da mão
nem a cama eterna
aponta a solução
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OBS:
quisera eu ser criador autêntico de tamanho paradigma...
na verdade o primeiro verso, creio, roubei de Cecília (Meireles)
espero que me perdoe teu espírito sublimado
maculada que foi sua arte.
ser poeta
e todo gozo dobra
perante o peso da alvorada.
daí que todo sol lacera mais a pele
e todo o sal
resseca a alma.
daí que não se tem mais nada
que não seja o papel
de seguir poeira afora
nas veias dos versos.
daí que a noite frígida
agita a calma
e posto em branco o ponto
tudo pode o negro
logro pouco da pena cansada.
e daí que resfestela
o meu ventre
ao ver a morte de frente
e a vida de costas.
daí que tudo mais
que não seja mais que dor
não me basta
não me consome como quero.
daí que sempre é nunca
nuca fria de perder o riso
e cada vez mais
se olhar no espelho
arranca do olho um cisco.
e eis ainda, que, daí
tudo posso
pois tudo fasso
com uma única falha
- a pena na mão.
segunda-feira, 15 de janeiro de 2007
onírico
todo sonho é passível de existência
(e de toda dúvida)...
que o caminho faça-se sereno
em meio a tempestade.
domingo, 14 de janeiro de 2007
sorte do dia
o raiar desse dia,
existe o refúgio supremo
de sublime alegria:
a tumba esquecida
do cárcere acolchoado,
o travesseiro eterno
que resvala o sono
em baixo da terra.
os astros louvam de verdade
somente os moribundos.
terça-feira, 9 de janeiro de 2007
covardia
nem tua cara de malícia.
sei que no fundo, maldito,
tremes à vergonha de viver.
não me chora o teu olho
nem bendiz tua língua
a bem da verdade.
tua alma nua é que assoma
vermelha o teu sangue.
a sucumbir tua vida
prefere qualquer máscara
todo passa-tempo.
sei que maldizes a hora
de se olhar no espelho.
tem medo de encontrar nele
o demônio
ou o vulto desfalecido
dos seus desejos.
maldito covarde
que não logra partir
nem ficar.
prefere morrer,
trucidar,
matar.
tudo para não ver
a falha em que sucumbe
tua alma.
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maior covardia é rejeitar a si mesmo. esconder-se, mutilar-se...
seria eu o maior covarde?
segunda-feira, 1 de janeiro de 2007
passa tempo
- louco dizia ser de paz.
mas com uma batida
virou o mundo.
os homens de ponta-cabeças,
mulheres de saia pra cima,
as rosas desgerminavam
uma dança que nunca termina...
e tudo dizia o sino
do alto da igreja
- a senhoria morta ao batizado,
o elipse, eclipse, apocalípse...
lapso!
o poeta, sim, amanheceu
louco
pra dizer tudo que queria,
pra cantar tudo que ouvia,
pra calar a tudo no ponto,
pra morrer assim,
feito chuva que estia.
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mas as curvas que traçou
essa ficarão
na terra entrevada
pra enlouquecer
ainda e mais
os meninos da lua