segunda-feira, 23 de julho de 2007

dor

nem dor se sente.

tem um quê ausente
que em tudo andava antes.

que era aquilo?
que espera...

amargo e longo momento.

minhas palavras de brilhantes,
quando em pouco as perdi?

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...a poesia não é remédio, como eu achava que era antes...

terça-feira, 17 de julho de 2007

pedraria


amor, viu a última grande muralha
que se ergueu em plena madrugada?
foi construída com laço de sangue
em segredo pela aurora fria.

o sol que brota, não mais da montanha,
mas da muralha sombria,
tudo separa e tudo aponta
revelando podre a verdade fina.

suas pedras, seus lamentos,
sua concreta harmonia dissonante e seca,
tudo em volta e dentro da parede
que bota sede na alma sadia.

saciaria alma, se pudesse,
mas alma de pedra não fala
por trás da parede
-esquife eterno de solidão.

amor, viu a última grande muralha?
não se preocupe, não procure, amor.
a muralha não está no horizonte.

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palavra de pedra
palavra perdida
no meio do caminho

andar com teu peso, que tua arma e arremesso
presos no peito, dilacera todo e qualquer sonho.

sai de mim, já não te quero, excedente
peso frio dos meus mortos amigos e amores.

quero de novo meu corpo-pedra
que se não amava, não cantava,
mas também não chorava, não gemia
no sorriso algoz dessa vida.
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sexta-feira, 29 de junho de 2007

senti-sinestésico-icídio

é estranho que hoje não me cale. estranho que toda imagem deistorcida vibre perante os meus olhos ardentes: tudo grita mais... até mesmo as pedras, até mesma a brisa.

vejo em tudo sinfonia calada, que se apregoa pelo espaço a fora. e dentro de mim o barulho que quer irromper o tédio, a palavra desvairada que precisa criar, o vício insaciável de escrever nas paredes brancas dessa vida pra ver se encontro na cor da letra o des-sentido da vida.

escrevo para vazar, pra me derramar inteiro nos teus olhos.
até que finalmente me olhe e eu vire idéia ou lembrança.

escrevo porque meu retrato é ransoso e não se satisfaz com o meu sorriso. ele não me tem. é retrato de céu, de árvore, de grama, de criança, de velho, de tarde, de hora, de praça, de mar, de estrela, janela, areia, água de rio e chuva...

e viver, parece que eu percebo, é uma doce vertigem. o des-sentido só, sem motivo, sem razão, sem compromisso: marivilhoso des-sentido, essa não-prisão, essa desnecessidade, esse não-tempo, essa eternidade...


voz sumida a minha.
sumida do mundo: fala ela... ninguém escuta.
diz com a mão, o toque, o calor em mim.
e é prazer e dor tão grande, que parece que vou romper, me rasgar, trucidar-me, acabar, explodir, sumir...
mas nunca, nunca, nunca, nunca morrer.
porque é explosão que ecoa e nunca morre, se debate para sempre nas paredes do quarto fechado.

suspensão

minha voz não está gravada
meu rosto não aparece em fotos
meu cheiro sumiu no instante
minha pele apodreceu negra
a alma perece aos poucos

e canta enquanto se desfaz
em doses homeopáticas
milimétricas e sem rima

não existe som no vazio
não existe luz dentro da carne
no cerne do universo
tudo cintila somente
lamuriosamente
como prestes a acabar.

não existe pergunta que não se cale
perante o segundo que se encerra
atrás das véias saltadas dos prédios
das pontes, dos telhados, das contruções.

a orquestra suspensa dos sonhos
sempre fingindo que tudo sabem
espertos que são.

mas no salto tudo voa, desprende,
esvaece

não resta ao menos o ponto
até que o poema toque o chão
.

quinta-feira, 21 de junho de 2007

onírico

sim! sonhar e mais e sempre
caminhar com pés de núvem.
respirar a brisa púrpura
e sangrar o sorriso branco.

sonhar pra escapar da dor
sonhar pra catar a flor da vida
sonhar para surgir a dúvida
sonhar pra semear poesia.

cantar pra dizer o sonho
com o espírito rouco,
e na virada da quina da hora
pra distrair o tempo pouco.

sim, sonhar!
blasfemar a verdade cinza
navegar esperanças
quebrar barreiras de vento.

sonhar e acordar
para não se perder,
para frasear,
fazer o ponto,

e montar a reticência
que se estende aguda
e segue aflita na espera
de suspender o pé do homem.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

totalidades

o todo é uma parte.
o tudo é parte alguma.
todo o tudo é cada parte,
que leva do nada à solução
nenhuma.

se, contudo, tudo é cada coisa,
tal é como se tudo fosse uma:
uma coisa meia certa,
meia parte, meio oculta.

tudo é um pouco nada,
- e nada adianta isso tudo:
tem ainda todo um resto
de parte, numa outra metade.

nunca tudo é tão distante
de tudo, em instante.
sempre e longe, de tão perto,
tudo oco e o todo nada.

terça-feira, 12 de junho de 2007

semi-obituário


perdão, caros senhores invisíveis,
pelo meu sensível e insensato silêncio.

volto aqui com a certeza
que não tenho mais,
de que o sol quebrará por certo
a treva errônea dos meus medos.

é que cá tenho o lirismo meio esfrangalhado,
doente terminal de mim mesmo.
doente de alergia, de abandono,
de tédio e de clausura.

e por fim, constado é, senhores,
o mal que consome:
eis que tudo me agoniza
pela falência múltipla
dos sonhos (findouros).

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ele agonizava e não entendia, porque não queria entender. até que um belo e terrível dia, teve coragem: olhou no espelho. viu a si mesmo, tal como era, tal como fora, tal como, na verdade, sempre seria. indignou-se, botou o pé no teto do rancor, afogou-se. depois chorou. depois cansou. reergueu-se, mais fino e mais pálido do nunca. tacou muito dignamente a pedra no espelho: partiram-se ambos, tal como ele esperava, o espelho e a alma. virou de costas, retirou-se de si mesmo. foi modelar-se, ele sabe onde, num futuro não sei quando, com a mão trêmula de incertezas, caminhando com os pés firmes e podres, enraizados no chão.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

brevidades

eis aqui meu corpo fraco
e a minha vontade de vidro.
nunca sei se fico inteiro
nesse fio de voz fina,
que se espelha no espaço.

eis o meu sussurro itinerante
que sempre se perde no instante
e no tempo transita mágoas,
poemas e alegrias pálidos.

jaz aqui meu sopro ausente
que some tarde da noite,
no meio do dia,
entre o desespero
e o esquecimento.

está aqui o que eu era,
o que sempre erra na vida
e no sonho prospera
- esse sonho que finda.

eis-me em chamas consumido.
da memória do mundo, perdido.
inevitavelmente, eis que daqui me parto
ainda que, deveras, nunca tenha chegado.

terça-feira, 22 de maio de 2007

irracional e irresoluto

é a constatação mais insana e mais exata: estou morrendo, deveras, no mais profundo exame desse errado momento. dói-me o peito, de cheio, e a mente, de vazia. o peito cheio de mágoa e angústia que carrega contra essa vida minha, miserável que é; e a cabeça vazia, não mais meditante ou significante, tão pura e sordidamente rota, esfacelada e corrompida em desencontro.
tenho asco. tenho sede. tenho saudade. tenho medo.
não tenho força (e, sim, como me dói constatá-lo, sou fraco e patético).
não me tenho, não mais, pelo menos.
a chama que antes me aquecia cálida, está bruxuleante, como em vendaval mortífero: a chama balança louca desvairada e insana, quer sumir.
a razão, que já perdi há tempos, dela me esqueci...
...

não tem mais nada que vale a pena dizer, por enquanto dure essa merda de nó na garganta da alma podre.
no mais tenho vontades, nada mais.


*desesperadamente deprimido e inquieto.

sábado, 21 de abril de 2007

uma canção por fazer

na brevidade da brisa soou um sonho
que na aurora dourada fez moradia;
das carícias dum Sol profundo se fez,
e nas noites de prata ele ardia.

um sonho de cantar toda e cada nota
em cada espaço de espanto que ouvesse
no tempo da vida suave.

soaria o sonho em cada e toda esquina
de vento que leve mais longe o encanto
até pro menino da calçada ao relento
até nos berços eternos, as covas,
ou os berçários e os varais e os jardins.

e nas tardes carmins, sem demora,
põe-se o sonho a tocar os lábios
na sabida e ávida face da distância,
que se deita macia, e me faz te encontrar.

e o sonho de cantar alto, de lembrar cada letra
da qual me esqueci, sem nunca ter escutado antes
tal quão doce melodia.

vontade de criar músicas do nada,
da poeira fugidía dos dias,
pra embalar em calmaria
toda essa profuzão de sentimentos
e sentidos confusos.

uma música que bastava ser um assobio,
um sopro, fagulha de alma e sonho,
-a saber, uma letra incontida e criança,
recém desperta no peito do homem só.

uma canção a se fazer no meio do seio da vida
com calma vadia de se escorregar e correr
nos parques e nas curvas do destino.

um tom brando e macio, marcado ao passos
que ressoam nas paredes brancas,
o coração que salta em pulsos cândidos,
enlouquecido pra cantar.

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o sol bate na janela, e alaranja e enche o quarto inteiro, inclusive o olhar e o sorriso. tô com vontade de cantar... mas sem letra, com calma, sem pressa, suave... quero cantar, mesmo que desafinado, uma vida inteira de sonhos e brisas.
escuto música nos seus movimentos macios, e nos seus cabelos, no seu perfume...
amor já é alegria e canto que me basta....

domingo, 15 de abril de 2007

pro doce olhar duma menina

nesse mal-querendo viver
arrebentei meu peito à sua porta
só pra ver se você se importa...

nessa coisa besta de contar o tempo
me perdi nas horas dos seus lábios
e nada além disso me devora mais...

corro entre o vento e o seu vestido
brincado de carícia com seu veneno
que me mata na felicidade, alento.

nessa plenitude dessa tarde
já aparece tempestade
mas me embriago das ondas
do seu doce mar-amar...

ê, vida cansada no peito de tanto pulsar.
corro entre os morros do nosso leito.
nunca canso de te esperar.

e se é alta a lua ou a hora
que não seja a última a chegar
pra nós dois a alegria desse olhar.

o seu doce toque, meu suor de amor.
juntos nessa tarde, crianças ao tempo
da inocência nua dum brincar.

e já não é sem tempo,
que me arrebata o canto:
para sempre nessa tarde,
sempre e terno, amar você.

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"que não seja imortal, posto que é chama
mas que seja infinito enquanto dure..."
Vinícius de Moraes

quarta-feira, 11 de abril de 2007

vespertinar

núvem matutina clareia o dia
respira brancura espelhada
na água do céu,
rio azul de ponta-cabeça.

de noite, à cima, precipício,
princípio e fim
no vazio estrelado.

os anjos quedam
sem o chão de céu.

sem asas, nem nada...

terça-feira, 10 de abril de 2007

asas (de outrem)

imoladas!
veladas,
inaladas...
aladas?
caladas.

terça-feira, 3 de abril de 2007

despedida incontida

os versos que outrora tecia
são puros e agora lhe entrego
o poema de sangue rubro
e branco de paz eternecida.

na clareza santa da espera,
essa pútrida mansão dos sonhos,
me despedaço em tom macio
com o toque leve que teu olhar me dera.

não vejo mais, embriagado
em desatino, a distância
tão próxima desse meu horizonte,
que plácido deita-se - a oeste.

é com teu olho d'água
que na noite enxergo,
prevendo as madrugadas
a galgarem os montes.

é com teu olho fechado
que em sono profetizo
o som que há de romper
a aurora:
alma vazia a acorrer socorro.

mas seu esplendor divino
gozava calmaria leve.
calava-se o espírito
(por hora breve)

tão definitiva calmaria
inigualavelmente ardia
invejavelmente sonhava
em tal eternidade dormia

na vaguidão do destino
nunca outra aurora haveria
nunca mais a espera
nunca e sempre, tardia.

os versos que outrora tecia
agora - tão tarde - lhe entrego
na carta de sangue e espera
na noite que não me sorria.

--
pro Bruno

segunda-feira, 2 de abril de 2007

infanticida

ainda lembro,
faz um tempo,
que o sonho me sorriu.

seus olhos infatis
lembravam-me...
ainda lembro
de mim?

na tortura do tempo
torto:
nu, como sempre fora,
eu nesse momento.

nu e pequenino
menino sonhador
e demente.

desde quando
sei de tudo?

desde de sempre
e por isso sempre desconfiava
desse fio de navalha
(sanguinária)
que é a verdade.

beijo, boa noite, adeus.
derreto-me a toda hora
buscando no sonho
a paz que a vida não deu.

domingo, 18 de março de 2007

cinzas de guerra (ou metrópole)

os arranha-céus eram vias
dum labirinto obscuro,
onde cada luz é um erro
e nunca se volta um passo.

de repente, se moviam
os corpos, incertos.
havia um desespero
no despropósito.

que se escondia
por trás dos olhos
cinzentos e vermelhos?
acaso sonhariam
outras paragens?

suspensos no universo
olhos e pés (pulsavam,
apenas) perdidos no espaço.

sábado, 17 de março de 2007

como se fosse de verdade


toda vez que encosto na pena sinto um calafrio, como pressentindo uma desgraça, ou coisa assim.

é como se já soubesse que cada palavra (e cada espaço em branco) já não têm sentido algum... não me levará a nada, não transmutará em esperança essa perda toda que tenho ainda por sentir nos ossos e nos lábios.

há um quê de podridão no sentimento, como que sempre e mais desgastado.

...

acho que não me encontro por pura idiotice... ou bom senso.
nunca se sabe o que o espelho realmente diz às nossas almas, sussurrando nos olhos verdades escondidas.
provável é que eu sempre suspirarei a pergunta, nas horas fugidias da escuridão, embaçando ainda mais as vidraças da janela:

quem sou eu, além do desespero dessa face?
e eis que sucumbirei novamente, a me derramar pelo chão, como poeira incômoda que o tempo não leva embora, até perder de vez a vista da paisagem, que placidamente observa, indiferente na verdade, minha tão frustrada egogonia...
que fizeram os homens para sentirem tremendo pesar?
conquanto fosse água, essa vazia coisa que passa e muda como bem entende, tudo seria diferente.



*foto http://membres.lycos.fr/cinephilia/hamlet/hamlet2.html

terça-feira, 13 de março de 2007

vagações

nas cidades, madrugadas.
e almas engarrafadas
em blocos de vidro e aço.

balançavam entorpecidas
num caminho tortuoso.
desdobrava-se o tempo
num sempre sem fim
- sulfuroso.

amontoadas, amorfas,
esquecidas de si mesmas...
onde parar os pés
ou a vida?

domingo, 11 de março de 2007

confissão.


em fim me deparo com a verdade que mais me dói. essa verdade de nunca ter dito nada meu. tudo que foi e fui, roubei. não havia palavra alguma que meu espírito soberbo e calejado proferisse por si só. não havia sonho, nem poesia. não havia amor. não havia nós. nada havia senão a dor. essa sempre tava lá. e ali, em toda e qualquer parte. por isso não é minha tampouco.

a noite, falo dela, mas é ela que diz. o pássaro não carece redizerem-lhe as palavras. nunca ouvi mesmo o vento - e a sua voz me faz falta. e as linhas e os pontos e os sinais inúmeros e incabíveis e as reticências congênitas e pútridas e aquele beijo, nada nada nada nada nada e tudo. nada era eu, a bem da verdade.

e eu que achava que sempre e mais me encontrava, mais me perdia, nessa coisa besta de perfilar bobagens em versos.

até acho que versei eu mesmo uma vez ou duas talvez. mas foi minha sombra inimiga que tocara o papel. jurei o desdito e chorei (de mentira?) a promessa que não cumpri.

e quando eu me for, o papel fica. fica, mas nem o papel é meu. e há de apodrecer na clandestinidade das idéias, nos subúrbios da razão e da verdade, e em metadezinhas míseras e impróprias essa parte já tão descabida de mim...

há de expirar desse mundo essa parte de minha mente tão logo eu também daqui suma.em síntese, ninguém nunca dá valor.
nem mesmo eu.

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*não me vejo meus traços nas faces de meus filhos...
na verdade, não vejo traço de coisa alguma.

foto: http://oneyearbible.blogs.com/photos/uncategorized/broken_mirror.jpg

sábado, 10 de março de 2007

de última hora



faz tempos que o silêncio emudeceu.
não sussurra mais meios termos
às meias noites...

nunca mais,
na imensidão dessa hora,
me soprou o vento
lástimas novas.

não cantou do poente
o sol vanglorioso em vermelho
que agonizava calmamente.

o luar serrilhou a montanha
bem ao meio, crescente.
e minguou em seguida.
sumiu - displicente.

secou nos meus olhos
o último grão de areia
da última onda da praia.

a mão tocou a falta
que se fazia indigente
aos pés da cama.

pressenti no espasmo...
...sumiste.
- ou era um sonho?
brandura nos meus braços?

foste esquiva, noite a dentro.
nada disse ao meu destino.

desiludido na escuridão
dessa certeza absoluta,
estou coberto em luto negro.
- mas ainda em vigilha te espero.