canto pra falar do nada
pra dizer tudo
em coisa alguma.
pontos de luz na treva
ou pontos de treva na luz?
porto pras minhas palavras
singelamente plurais e (im)puras.
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
talvezes
preconizando um fim de ano
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
feitiçaria
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
amante
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
rotina da cama

terça-feira, 12 de outubro de 2010
vícios
vida despercebida
terça-feira, 5 de outubro de 2010
carta para um amor distraído
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
fortes
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
cosmologia
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
após incontáveis funerais
segunda-feira, 28 de junho de 2010
passada a poesia - ou depois do devaneio dessa vida
domingo, 16 de maio de 2010
indefinívivel
sexta-feira, 16 de abril de 2010
quarta-feira, 7 de abril de 2010
saudade
foi uma coisa que veio batendo na minha janela dia desses. uma janela que só me deixa olhar admirado, sem me deixar passar, para a mais nostálgica paisagem: a praia de camburi.
pedaços macios de infância foram enterrados na areia com o cuidado de quem esconde um tesouro, e, anos depois, resgata as poucas moedas que restaram pelo chão (onde não mais existem conchinhas ou siris).
mas memória não se troca, nem se pode escolher por esquecê-la. memória é esse óleo que sai de mim para a minha pele: aparente, visceral, persistente, às vezes até irritante.
memória que não me deixa ser quem eu não sou. que me prende ao destino de ser eu, com correntes que se estendem ao passado. memória que me fere e fortalece, com lágrimas risonhas, fotos desbotadas, vozes distorcidas, mas rostos firmes, rigorosamente pintados e impressos no meu próprio rosto, na minha alma.
rostos que, partes de mim, jamais esquecerei.
terça-feira, 6 de abril de 2010
inexorável
segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010
pequena - ou amor
que a pena dança
pequena essa chama
que queima consome cansa
gama essa pele na minha
que a dança à mingua dana
até virar, pequena, ciranda
que até meu olho fascina
cala essa boca na minha, pequena,
que espera a cama
nem deixa a lingua sozinha
na nota conforme canta
como essa chama acalma, pequena,
a alma pequena e mansa
deixa sua chama na minha
pra ver quem é que ama.
a pequena chama chama pequena.
quarta-feira, 27 de janeiro de 2010
profecias de carne e poesia
de quando em quando surge uma manhã em meus olhos. por entre as sombras das flores que nas árvores do jardim suspiram primavera, o sol beija teu rosto com ouro fino. a brisa rasteja pelos leves lençóis de algodão, faz dançar de suave, numa embriagada e tardia balada, os teus cabelos negros. quem sabe quantos pássaros flutuam travessos no céu azul?
suspira despedindo de um sonho bom, ainda com os olhos fechados. há uma certa sinfonia discreta no teu despertar. por entre a janela semi-aberta, nem os vultos minúsculos do que ainda será labuta, descanso e prazer cotidianos conseguem adivinhar os teus seios, de onde brota um ritmo manso, de um coração que brinca de tocar tambor e bandolim, em plenas 8 da manhã, como criança da praça: regendo constelações e pedindo esmolas.
levanto, dou-lhe um beijo e abro a porta, como quem sai do sonho, como quem foge, como quem abandona.
que a colombina me espere até o próximo carnaval.
sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
salma
as pernas e as penas soberanas,
querendo olhos e escamas.
coração contravenção só
entre um paradigma e o outro.
nas entrelinhas do tempo - ou refeição de gigantes
tem passado como?
"como" tem passado?
comido? comida?
como indigesto, passo?
como pasto? asno?anos?
como como quem come passado?
tem passado? como?
como teu passado - à la Cronos.
ausências próximas
algumas o são, e mais:
suaves metais.
---
para c. de cássia
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
galacta
fluxo de pensamentos inomináveis
quinta-feira, 29 de outubro de 2009
pequenas sinfonias
como lâminas finas, fluidos corrosivos
e desembocam intranquilos
da minha língua inquilina
de verbos sublimados
morada
que era nulo, vago e morto
julguei-me errado,
julguei-me roto.
mas minhas pernas erguidas
minhas penas sofridas
arrancaram-me, elevaram-me
com mais força que pedra firme.
sou mais sólido que o vento
e quando eu tento
posso até ser mais que penso
mesmo que um pouco tenso.
de agora em diante, não mais remorso
sei que agora tudo posso,
que tudo traço e destroço:
eis meu sorriso no rosto.
resguardarei minhas intenções
arquitetarei revoluções
e dos meus medos superados
erguerei fortaleza e treva armados.
serei negro e branco e transparente
nunca d'antes tão presente
nunca antes tão como eu
jurei e juro ser meu
inteiro no erro desnecessário
completo no gozo herege
e na nudez pura que me rege - até a hora da morte,
achar em mim o abrigo provisório.
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
carta imprevista e desconsiderável para o todo
tome cuidado com isso também. se somos o que pensamos que somos, temos que prestar mais atenção em quem nos diz como nos pensar.
grandes votos! abraços.
espero conhecer ou conversar com você um dia.
até lá, força, luz e felicidade para você e para os seus.
ass: m.o.
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
ânima
de tudo que eu poderia ter sido
viver só esse horizonte belo e tecido
com veias de montanha, céu e mar
deixar morrer essa fantasia minha
que eu não mais controlo, desolado
ressucitar em mim a vontade pequenina
de um velho garoto inacabado
sentenças ou juízos ou da morte dos meus últimos sonhos
uma mão firme e imaginária dá voltas à chave, escondendo os dois ali dentro como um segredo a ser esquecido.
- E agora?
-...
-...
- ABRE ESSA PORTA!!!
-...
- ABRE ESSA MERDA!!!
as batidas ecoam, flutuam no aposento mal acabado, vasto, imenso, infinito... e minguam, murcham, morrem.
silêncio. tempo.
- E agora?
- Agora é esperar...
... tempo grande e sem misericórdia.
- Não consigo! - diz baixinho, aflita, e chora só lágrimas, sem soluços.
- Shhh, calma! - pegando ela pelos ombros, abraçando contra os dele.
- Os outros! e os outros?!
- Não sei... sumiram como os gatos da tia Adélia, ou as chaves do apartamento. Talvez nunca sejam encontrados.
- Será que eles...?
- Não, não!
...
- Você me ama?
- Não. Não mais... não te amo há 7 anos.
- Sexo?
- ... pois se a carne é fraca...
...
- Queria um cigarro.
- Queria comunhão.
- Foi bom?
- Sim. E você?
- Sim... sabe, sempre te amei mais.
- Hunf.
- Sério!
- Poupe-me.
...
- A gente vai morrer, né?
- Vamos.
- Fomos felizes?
- Fomos o que?
- Felizes! Fomos?
- Será que fomos...?
...
- Será que vai doer?
- Um pouco, acho.
...
- Não era pra terminar assim.
- Não, não era...
...
ZAPT! jorra sangue multi-colorido, que entumece, enegrece, apodrece e evapora.
e o que mais me apavora: em mim nem doeu.
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
da chave encontrada
um gozo de lágrimas
súbito e sulfuroso
intenso copioso
quase melodramático
se não fosse o mais real
como num abre-te sesamo
encontrei meus rios salgados
pela boca de um sábio ocasional
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após meses de candura e cara branda, um raio de esperança:
chorei como criança no quarto empoeirado
como adulto em quarta de cinzas
chorei uma liberdade mínima e imensa
suspendendo uma sina
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
na verdade, parece existir nessa atmosfera uma ausência, uma sensação de que algo está para acontecer, uma aproximação do clímax ou do apocalipse.
há uma falha na fortaleza de vidro e pedra e ferro, na fortaleza de nuvens de elétrons e tempestades. uma brecha que deixa entrever os olhos de uma besta epilética, demoniacamente insana, fora de si, alimentada por anos de fome, prisão, residente do medo, numa sede de caos e lágrimas, que parece não alcançar um limite menor que o seu próprio orgulho, que é muito, ou da espessura de sua imensa masmorra.
há um desejo profundo, profano, impronunciável de que ela me ataque com seus olhos distorcidos em banquete. que minhas entranhas nutram as suas, que os meus pensamentos, minha letra, minhas meias de algodão manchado e as camisas de seda, meus amores, meus pais, minha poltrona, meu cinema, minha biblioteca de livros por ler, meus pés de caminhos percorridos, tudo que em mim sou eu ou fora de mim se desmanche em seu estômago satisfeito.
quero isso e quero muito! preciso, imploro, peço a mim mesmo que me dê a chave que prende todo aquele caos atrás das grades intumescidamente titânicas.
tarde percebo que joguei a chave.
ou antes, que tragicamente, ela nunca existiu.
esqueci a senha, não tenho o passe, não controlo, não sou - não mais - o rei desse castelo tão meu.
terça-feira, 22 de setembro de 2009
acidente protético n°1 - ou da visão de ângulos múltiplos
de vidro!
um globo
inteiropartido
lamentações
terça-feira, 15 de setembro de 2009
fotografia - ou a escrita do tempo
todas as cicatrizes na face muda
mudada da infância nua e bravia
- agora resíduo, espera rouca.
visita-me como em douto presságio
das minhas profecias preferidas
enraigadas nas veias, na tela, na moldura dos ossos
- uma manhã tão distante da janela.
costura de costume e graça
numa névoa densa ao toque da memória,
pequena tapeçaria empalhada de minha glória
perdida - nos entrepassos do tempo vadio.
o sol enlaça luz e traças na carne
radiografada na fotografia surrada,
roubada de minha alma tão alheia,
roupagem de um sonho vivido.
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o sol na foto, e lá fora na grama, no céu eterno e branco
o mesmo sol da antes-Terra, do chimpanzé e dos dinossauros,
dos neandertais, dos sapientíssimos ocidentais e dos orientais pacientíssimos,
de newtons, einsteins, balzacs, mozarts, openheimers, hitlers, dalis,
akiras, mao tses, confúcios,
orixás, iatolás, xexênos, nigerianos, esquimós,
bailarinos, palhaços, bandidos, extremistas religiosos,
ditadores, índios, nômades, ciganos, defuntos, crianças, não nascidos...
sol em foto é o retrato da ironia.
boemia
seja reflexo imprevisto da alma
que pela manhã dissolverá dores minhas
numa gota surpresa de frio na espinha
se houver tal momento, desejo prazer
na manha rala das salas vazias
e havendo riso destilado, traz-me
uma dose em três de euforia
e se nessa fria, tremenda madrugada
houver companheira ardente e ingrata
dai-me, noite em claro,
esperanças de alvorada.
segunda-feira, 3 de agosto de 2009
do rosto irrefletido #1
em cores tais que descoram
como sangue seco nas flores
que o alto de berços decoram
tenho coragem para refletir
em minha efígie esse alvoroço
e no resto do que sou, no dorso,
carregar a letra que me ferir
amaldiçôo as noites que escuras
predizerem minhas torturas,
os sinos e as linhas proféticos
que dispersarem no vento o meu eco,
melodias que finjam meus amores,
ritmos que desafiem meu maiores erros,
esses verbos poucos que me ditam
na veia os pulsares que me limitam.
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esses sons desiguais se enlaçam
como lâminas finas, fluidos corrosivos
e desembocam intranqüilos, agudos
no espírito dos que os perfaçam.
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*porque nessa sina parece que falta hemoglobina e sobra verniz e resina.
sexta-feira, 3 de julho de 2009
quitutes
suas salivas quentes me saciam, me entorpecem
me enchem de um gozo pleno, sem cautela.
línguas outras que me falam o que eu digo
antes de eu pesar as idéias pensadas.
repouso na língua de outrem, me cubro
e descubro com seu hálito quente.
e é confortável, até quando me engolem.
sou parte num todo, estou digesto
e me alimento até de mim mesmo, se preciso.
e me sacio, como se fosse isso possível.
e acabo, como doce em boca de criança gulosa.
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e você pensa que não se alimenta de mim a cada palavra lida?
quinta-feira, 2 de julho de 2009
do ímpeto n°2
que em si não terá nem lágrimas
nem gozo alheio nem rimas
algum que seja obsoleto
nenhuma linha no tempo
a rebeldia confusa
uma liberdade obtusa
que supere esse lamento
eu não sei ainda fazê-lo
não serei eu o autor
entre outros a mim será o elo
nisso nem haverá dor
nem será assim puro o poema
noutro papel será edema
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*há liber-dade e gosto até no despropósito.
do ímpeto
do mundo, por trás das re
gras, das n
ossas leis apaga
das, enraizadas, enrai
ve(n)cidas,
loucas.
o mundo, por pouco
-que um pouquinho só-, es
tá entre
laçado,
agonizante,
nas noss
as v
ontade
s.
--------
*comorespostaaumamigo
segunda-feira, 29 de junho de 2009
da digressão linguística n° 1
(do insight) da plenitude
deixei-me acreditar / que era nulo, vago e morto / julguei-me errado, / julguei-me roto.
mas minhas pernas erguidas / minhas penas sofridas / arrancaram-me, elevaram-me /com mais força que pedra firme.
sou mais sólido que o vento / e quando eu tento / posso até ser mais que penso / mesmo que um pouco tenso.
de agora em diante, não mais remorso / sei que agora tudo posso, / que tudo traço e destroço: / eis meu sorriso no rosto.
resguardarei minhas intenções / arquitetarei revoluções / e dos meus medos superados / erguerei fortaleza e treva armados.
serei negro e branco e transparente / nunca d'antes tão presente / nunca antes tão como eu / jurei e juro ser meu
inteiro no erro desnecessário / completo no gozo herege / e na nudez pura que me rege - até a hora da morte - / achar em mim o abrigo provisório.
quarta-feira, 24 de junho de 2009
verdades universais escondidas na parede branca
mas parece que no fundo toda sabedoria deseja ser burra.
quarta-feira, 17 de junho de 2009
do sonho no cansaço
das (co)incidências atônitificantes
quarta-feira, 10 de junho de 2009
do primeiro julho
póstumo ao último outono
domingo, 7 de junho de 2009
SETE DE JUNHO
deixa a manhã correr partida
e todas as flores no mar, recaídas,
são todas as dores a mais, esquecidas.
deixa pra trás as palavras frustrantes!
arranquem os amores, melhores amantes!
deixa apagar essa chama ferina
e a todo o mal pelo ar repugna.
deixa decepar a paz pequenina,
que toda mudez se impõe repentina
no palco, no altar, no paço sombrio
- fazendo d'alegria o mais tenso arrepio.
deixa o sangue correr furioso!
deixa a lâmina lamber, assassina,
derramar o raiar, pôr-do-sol glorioso,
apagar essa marca do horror que fascina.
retoma em passo que então se aproxima
a escuridão que ilumina o cruel labirinto
desse homem nu, morto, faminto
que do fim, só do fim, se aproxima.
segunda-feira, 25 de maio de 2009
pichações mentais na avenida principal
a cidade não consegue dominar meu corpo, e ando livre. a cidade não pode dominar meu espírito, e penso novo. nem meus sonhos, nem meus desejos. apenas os meus olhos ela domina com o cinza-mais-pesado-que-as-núvens. e me apareço mais leve, mais rarefeito, condensado aqui só por acidente, sem motivo.
domingo, 17 de maio de 2009
das des-identidades
filosofologia #4 [da ética existencialista]
sexta-feira, 15 de maio de 2009
filosofologia #3 [da negação existencialista absouluta da linguagem]
tem me entediado cada vez mais pessoas se definindo e ao mundo com palavras alienígenas à si mesmas, sem um segundo de esforço, sem vontade própria, sem vontade alguma.
ando receoso em relação às palavras, com todas essas pessoas acorrentadas nelas...
filosofologia #2 [do anti-humanismo solicissista transendental]
quinta-feira, 14 de maio de 2009
filosofologia #1 [literatura existencialista anti-humanista]
terça-feira, 21 de abril de 2009
grunhidos da meia noite
auto-retratos
sorrateira num arbusto monstruoso
que meu leito e minha amada dominou
num sonho pestilento e grandioso
me esquivo pelas pálidas esquinas
do meu rosto desmedidamente atrofiado
temeroso aproximando-me das finas
garras dos amores embalsamados
se revelo minha sina à luz esguia
não reconheço o meu medo revelado
se escondo minhas flâmulantes heresias
não sobrevivo ao amargor do claustro
e na balada madrugueira me vejo outro
deixado no repouso da cama morna
lívido, em carne viva, me percebo roto
éfebo de minha arte matreira e morta
quinta-feira, 2 de abril de 2009
pé no negro
das tramas da sorte agoureira
é rainha da noite, é guerreira.
mais longe que amores amantes
se fossem lá soprar, distantes,
maior que os menores andantes
a dança que é fogo incendeia
se tem prata no mar, lua cheia,
êh, nas ondas do mar cambaleia
mil folhas se agitam dançarinas,
no afago do vento, meninas,
a cansar de rotina as retinas.
na vela sem fogo desfaz-se
na carne um silêncio sem face
da terra é um grito que nasce
na boca da noite, rainha,
que a espada da dor embainha
é calor, é tambor, é mãinha.
-------
dos feitiços que cruzaram os mares, amar foi o que me ensinastes
e viver no negreiro navio, que parte sem buscar caminho.
ó, mãe áfrica, minha dor, meu sangue, onde estão seus fuzis e seus tanques?
enterrados no mar oceano, outrora seus mais graves danos.
e se agora és clamor aflitivo, ainda nos dará um festivo,
'inda vossos frutos nossos filhos.
*pro sangue de negro que chora e faz folia no meu corpo inteiro.
.
e feito aparece o feio fim
que veio de encontro ao mundo
e tudo desfez por conta de mim
quarta-feira, 25 de março de 2009
preâmbulo de maio
se lhe digo o que convém, eu sei que sigo
a oratória do amanhã: na calmaria o castigo.
na calmaria o castigo.
deixe estar, que a carne em revolta é perecer
e a vida rouca ainda dói na prosa pouca do anoitecer:
o beijo celado e os amores roubados nas cores de maio.
deixa estar, que a cova é bem raza, cê pode ver
a chama dança na vela e cai do meu peito.
não é frio, não é lixo, é a ilusão de ser do meu jeito...
deixa estar, que o amor não acaba com a partida
e se digo que fico, ainda, saiba: não estou perdido.
e peço ao céu uma estrala vaga, uma seta ferida,
e as flores rasgadas.
e se o vento levar pra longe esse seu sorriso
deixe estar na saudade o seu vício.
deixe estar a saudade comigo.
- na calmaria o castigo,
na calmaria o castigo.
sábado, 21 de março de 2009
das palvras que outrem se-me-disse
que comunhão distorcida, amarga, une os homens?
em que medida medeia-se o percurso entre o você e o eu?
em que medida se-me-revelas?
em que medida se-me-desnudas?
em que medida há distância tão próxima?
é a linha oblíqua, distorcida, que une dois pontos.
será que ela mede até o medo?
se fora poesia afora
que essa não repouse em boca muda:
que tenha som e vida, e oriunda
ela seja da desarmonia sincera.
e aí, serei eu em minha medida
na resposta - se mim, em ti úmida
de alma e carne viva minha.
- sangrarei, tardio, em brisa alheia.
repousarei sob asas de poesia inteira
e mesmo incompleto, ainda folha rasgada,
então um tom partido, uma bruma pesada.
serei eco e sopro de lábios celados
e meus sonhos, calados, soarão, revelados
- e serei, no fim, mudez que prospera.
Paisagem pouso incerto
passaria, possível, perto.
pousaria, calmo, pertinho
povoando em vôo o oco certo.
passa passo-a-passo
parecendo até que ensina,
pondo um ponto no que faço,
ponderando no vento minha sina.
passarinho professor da passagem
passarinho por sobre a paisagem,
pondera o tempo sem passado
professorando: deixai o paço!
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buscando uma fuga.
quarta-feira, 4 de março de 2009
o que sobrou do natal
não há nelas escalas ou réguas.
são fruto de acaso solto, desconexo.
se no gesto há harmonia, ou o inverso,
ainda falta ritmo, e calor. ainda falta incesto.
falta dormir a música no leito do poema,
e talvez até ainda lhes falte paisagem
mesmo pequena, mesmo alegrezinha,
para haver uma próxima viagem.
quiçá não há o que ser feito, é só.
é o que se pede e nunca alcança -
"Papai-Noel, me faz poeta!"- e espera.
ele me deu livros, papel, canetas.
até sonhos e chama ele me deu.
mas se ao menos a fantasia desse nó
a cada palavra, a cada criança
nos meus dedos, haveria mesmo poesia
e não apenas só as penas e o pó.
a fênix
e é por isso que sou assim calado, assim quieto,
e só movo-me deveras pelos olhos, à míngua,
às lágrimas, aos risos. atrás deles eu arquiteto
a próxima sílaba da minha manhã, ou o ponto
(mais-que-final) do último anoitecer. e refaço,
e desfaço, disfarsando que nada há de meu
em cada traço riscado ainda em mente, ainda eu.
e quando a boca se abre, o mundo está pronto.
o som sai e ecoa. é boda e é festa: renaço
depois de morto, depois do último sopro.
e já não sofro e já não temo as minhas sombras.
vivo nas ondas do som, das palavras sussurradas.
já não me sobra nem falta nada: todas palavras usadas.
não há mais peso sob os pés ou sobre os ombros.
vento novo no meu corpo: elevo-me, revelo-me, me movo.
sábado, 21 de fevereiro de 2009
a festa da carne (ou depois)
"todo carnaval tem seu fim".
e a vida volta a ser quaresma
numa púrpura e apagada réstia
de sol, ao entardecer do desejo,
na fé de habitar onde nada resta.
e tudo que se fez, cada ensejo,
foi como se não o houvesse,
nem fosse, virou poeira e prece.
a febre volta à frigidez, ao mormaço
as mãos esperam o próximo passo,
como se ele fosse o algo necessário.
depois da bonança, a calmaria,
o desprópósito maior que a festa,
- maior que a despudorada vergonha
- que atesta de pronto um desânimo.
a carne, ora entorpecida, apodrece.
o orgasmo morre. a vida adormece.
quarta-feira, 28 de janeiro de 2009
translação
mas fica fixa a inflexão do paradoxo, quebrado.
mudar como caos e mudar como torcer e mudar como quebrar e juntar de novo.
as almofadas encapadas de cetim e veludo.
as bailarinas de fino toque jovialmente virgens.
a petulância das mansões do século passado.
as flores desinteressadas da avenida principal.
frivolidades alegres e frias como geleiras.
há qualquer coisa de obliquo, de distorcido, sem ser diferente.
sem estar diferente.
quinta-feira, 8 de janeiro de 2009
CARTA ABERTA À HUMANIDADE PARA 2009
digam-me que o engano faz parte do acerto, e que as estrelas marcam a direção dos sonhos. digam-me que a felicidade reside no sorriso alheio. que cada pessoa no mundo consegue ver um espelho seu no destino abandonado das criamças de rua, nos alcólatras e drogados, nos desvalidos, nas viúas dos soldados, na saudade dos exilados, na rancor dos desprezados, na sobriedade solitária dos indigentes. digam-me que o mundo tem chance e podemos esperar mais das pessoas. que não há vazio onde houver fé no homem, que não há dor gratuita e indiferença. que o salário é justo e a dignidade é farta. que o sabor do vento é doce, que a maré é saudosa dos corpos na praia e as geleiras fortificam-se. que a metade de lá do globo vai descansar de noite. que o pai do fulano vai voltar de viagem, e a mãe do cicrano vai curar do câncer. prometam-me que todos seremos menos mesquinhos, e a sinceridade trafegará entre os olhares como em infância, e sejam verdadeiros e acreditem e batalhem... e me dêem paz. e me doem esperança e coragem pra enfrentar mais um ano de luta sem descanso em busca de felicidade e felicidade verdadeira.
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atrasado o pedido. mas a busca permanece.
sexta-feira, 2 de janeiro de 2009
ser/estar
estou eu aqui pelo erro do evitar dizer
de evitar e negar o que inevitavelmente se é.
por causa daquilo que irrevogavelmente busco e irremediavelmente ignoro:
aquilo que me fará um dia ser completo, perfeito e uno
e tão e mais eu comigo mesmo.
estou aqui, por inenarrável e ignóbil erro de acaso, gramática e lógica:
estou aqui, irresolutamente, por minha causa.
por tudo aquilo que, no fundo, espero de mim. por tudo aquilo que o futuro não me revela, e nada mais que o tempo é desvendar.
estou aqui à espera
daquilo que ainda não sou
do homem que um dia serei.
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o limite ilusório entre o sonho e a realidade é a crença nas nossas certezas.
o limite real entre a crença e a dor é a verdade.
terça-feira, 16 de dezembro de 2008
dos erro(e)s
e o que diz a mente oculta.
revela a relva a rosa rouca
e a reza é ressalva, não ranso,
nem riso. é roupa rasgada,
é carne viva e revolta.
é rastro e ramo de todo resto
é posto e casto presto.
reembala o rosto e a resma
parece uma quase quaresma...
que comocadente restringe ao castro,
ao quarto sujo, o retorno, o prúrido incesto:
a relaxada ronda do temido gesto
na ferida, na alma, na terra rasgada.
retoma e retorna, que a roda revira
e resta ainda a ultima prece:o beijo
e o suspiro, sem suspense
sem resposta, sem senso.
resvala a rústica ressalva
ainda respiras sem alívio.a
inda reviras a pedra
a procura d'um rio.
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
que(r) dizer
Mas enfim... Será que isso importa?
Ou ainda: será que isso já não é por si só encontrar-me todo significado?
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
água queima
- vazio, pois não era morada,
profundo, porque era mistério.
e cada gota d'água que ali
suavemente era plantada
sumia, virava lodo.
e cada corpo que lhe pungia
a tenra superfície, morria.
esgotava e secava o movimento.
e cada sonho, ele dissolvia.
e cada alma, ele consumia.
somente a dúvida ele alimentava.
e ele crescia e inchava,
até que sumia o próprio dia
até tapar o próprio Sol
até encostar na Lua.
o lago, algo como coisa viva,
a tudo destruiu, e de subto calou.
passou dia, passou-se eras.
e o lago, apesar de maligno,
estava calmo e imenso.
os homens, por desmedida,
lhe nomearam Oceano.
os homens, por ingênuos,
lhe chamaram Pacífico.
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
que nome é possível?
coisa de uma cena que me angustia com uma dose inoculada de remorso.
dessas que aconteciam todo dia, no início de tudo. no início do meu início. na inexorabilidade da minha própria existência.
algo que como uma comoção incomoda, quer perfaz minhas artérias, minhas veias, meus pulmões com a baforada seca a acre de minha mudança, de meu apaziguar-se, da minha inegável estupidez. da minha configuração, adaptação, do meu deixar levar. e capaz de emudecer-me de tal forma, que meus olhos, percebo, estavam surdos.
se fosse obrigado, culparia a metrópole, e seus úteros podres, que só parem destinos falhos e abominação. ou à psicologia, grande mestra de muita de nossas ignorâncias. mestra verdadeira, pois nos educa e nos justifica. nos torna impunes por natureza, naquele mecanismo de auto-preservação, que aniquila o terror que nos assola nas calçadas imundas, nas praças, nos becos... a ponto de eliminar o desconforto da desgraça iminente. sedando-nos, e nos insandecendo.
mas a verdade me força a maiores razões, a uma maior distância. ela me joga nu na rua fria de uma realidade pavorosa, onde a chuva inconstante torna aflito o sono e o coração.
a cena se resume numa praça burguesa da cidade, onde tantos transitam irreparavelmente absortos em seus problemas, uma multidão de solidões.
no meio de um canteiro gramado, uma mancha se meche e respira. a era um menino, mirrado, uns 7, 8 anos, encolhido debaixo dum trapo, adormecido por entre a orquestra violenta da total indigência metropolitana.
passa uma mulher:"por favor, onde fica a Rua Ceará?" numa voz de outras terras - nordestina, com certeza, roupas bonitas e simples. achei irônico aquilo, sorri por dentro. respondi:"acho que uns dois quarteirões abaixo. mas não tenho certeza. pergunta naquele bar, eles devem informar melhor." seguiu-se um"obrigada" de sua parte e da minha, "boa noite".
eu fumava tranquilamente. a chuva fina não era problema meu. ponto de taxi em frente... tudo bem, estava já praticamente em casa, 23 quarteirões dali.
a mulher vai ao bar, volta. paralisa-se um instante. vai até o menino, cobre-o com uma blusa dela num carinho quase maternal. deu-se um tempo de um minuto aquela cena. e cada gesto seu me comovia. ela deixa o menino ainda dormindo, se afasta de vagar. toma seu rumo para a Ceará.
a visão me deixou estarrecido. não por nunca tê-la visto, mas por perceber que tinha desgraçadamente me acostumado a ela, nunca percebido a coisa nela como parte de mim.
me culpei, senti-me sujo em minhas vestes, um verme. como me tornara essa coisa que tanto abomino? essa massa mansa, que se deixa levar cega e surda pelas ruas? cabresto?
aquele ato de uma desconhecida a um indigente, puro e simples compadecimento, cheio de um importar-se com o outro, alheio, vago, nulo, perturbou-me.
parecia que eu havia recobrado a visão, e uma dor necessária me tomou. remorso, egoísmo, indecência. deu-me vertigem suspender o manto transparente da realidade.
aquele menino, tão humano, tão igual a mim... apodrecia com o que parecia ser o meu consentimento, com a minha inércia. senti-me horrível. perguntava-me porque. vi que algo na alma, somente nela poderia despertar essa sensibilidade. perguntava-me o que meu pensamento, o que a minha vida poderia fazer para ajudá-lo. não para limpar a minha consciência, não para livrar-me de um fado pesado. para libertar-me de uma cegueira, para mover-me em ação definitiva.
pode o pensamento de um só realmente mudar o mundo? sempre me parece que não. mas não me conformava com essa resposta. que podem os sábios e os poetas em seus gabinetes, em seus livros contra essa maldição?
parece-me que tudo agora tornou-se frivolidade. mentes dissonantes com a verdade, aquela que tanto se busca e tanto se esquece. a vida não são pensamentos nem palavras, como tudo que eu era, como tudo que sou. a vida é maior e pior, mais baixo, mais ventre e entranha. a vida é estômago, não cérebro.
resta-me essa sombra de inutilidade. esse persistente despropósito. esse pó.
o menino, continuou a dormir, na chuva. tentei acordá-lo, me afastou, ainda dormindo. "você vai se molhar, amiguinho! acorda!". nada. a chuva aumentou sentei-me ao seu lado, esperando que houvesse ainda resposta diferente. nada. dez minutos fiquei, remoendo as sensações. por fim, largando-o miseravelmente ao abandono, fui ao taxi: "pega a francisco sales."
e cá estou. incomodado. confuso. como a derramar bile em linhas, em palavras. confinado na minha insignificância, na miséria alheia, que se fez minha. sou parte disso. não como eu pensava, mas como realmente era. dói-me. recolho-me.
como será o mundo agora?
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
o rei dos ladrões
o muro da tua casa
é tua guarita de guerra.
se estranho se aproxima,
não espera! atira!
e ferra o desgraçado!
não deixe a porta aberta
segundo algum, nenhum dia.
põe cruz dentro, contra bruxaria.
não estremeça quando o medo,
o de mãos terríveis, lhe tocar.
sê firme! e morre, sem ralhar.
à noite não durma,
de dia espera e guarda
sua madrugada.
e aguarda que te encontra
esse pior bandido, inimigo copioso:
esse amor sem razão ou consolo.
segunda-feira, 10 de novembro de 2008
dum lugar no tempo
murmuram livros de vento
com vozes de pardal e sabiá.
a tarde enaltece a paisagem,
as idéias suspiram novos lares
e repousam nas prateleiras.
olhos atentos procuram
palavras, versos, teorias.
a tarde anoitece a passagem.
a porta está entreaberta,
as crianças gingam, esculacham,
e cadecem de novos horizontes.
há uma infância toda
enclausurada e livre
nas mãos de Fernandos, de Carlos, de Ligias e Cecílias.
cada página respira.
vilas aparecem, passam laranjeiras.
Lucas lê Crosué nas casas de Minas.
quarta-feira, 5 de novembro de 2008
a última lembrança
deixe a luz acesa.
cada dia é um segundo, mãe,
antes que eu adormeça.
deixa fora, mãe, esse medo
ele não deixa a paz.
esconde logo esse silêncio,
ele não se desfaz!
tudo agora é vazio, meu filho.
deixe estar.
o mundo é farto e eterno fastio,
o que resta é esperar.
deixa disso, mãe! vem! se mexa!
a porta está aberta, é só passar.
vai-se embora! corre, menino!
é a sua hora de atravessar.
que é isso que cê treme, mãe?
alguma coisa aconteceu?
não é nada grave, querido
é só que agora me anoiteceu.
quê eu fasso, mãe? agora tá tão frio!
por que dessa voz rouca?
vai-se embora que a manhã é pouca, filho.
não te esquece que a brisa é sempre abrigo, e vai.
o Sol te aquece, e não esqueça:
cresce! voa! corre, menino! agora o seu destino é seu.
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*imaginem um violão tocando ao fundo,
encontrem um ritmo...
será que eu paro por aí?
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
os sonhos dos eternos
que eu não tenho,
dançaria na chuva
enregelada de amor.
se eu tivesse o sonho
que eu não tenho,
beijaria o som
de tua terna voz.
se eu tivesse o sonho
que eu não tenho,
regaria teus pés
com olorosos perfumes.
se eu tivesse o sonho
que eu não tenho,
saquearia da noite
as tenras estrelas.
se eu tivesse o sonho
que eu não tenho,
desejaria mais um
para não ficar só.
ah, se eu tivesse um sonho...
seria sonhar realidade
mais pura, mais branda
e mais ardente - tempestade.
arremessos
uma pedra
no rio.
sorrio
sozinho
a espera
das ondas.
a pedra
fincou
o pé
na água,
e ficou
pra dançar
no raso
do rio.
domingo, 12 de outubro de 2008
quarta-feira, 1 de outubro de 2008
mil coisas
e eu no meio e eu abaixo disso, imaginando as coisas mais escuras ou claras do que elas são, sem saber o que me diferencia delas. sem saber o que me liga a elas. sem saber o que ser.
sem saber o que dizer para me reconfortar dessa pontada de desânimo, dessa manhã clara, nessa vadia sorte de principiante, que escolhe a todos e à ninguém.
vai ser difícil, pensei, mas nem tanto.
há coisas piores do que cair no poço.
não encontrar a saída desse, não saber onde é pra cima. não saber que sempre se está no poço.
não saber que isso nnão é ruim. não entender e se matar aos poucos por isso.
mas as coisas continuam no fluxo de um rio. cair no poço pode te levar por leçóis de terra, abaixo dos pés e da razão. até florescer como água nova, lívida, fundamental e precária.
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
...o que será que é isso?
algo que comove a alma, corrompe a mente, deixando as núvens vazias, as flores confusas de cor. Deixa tudo envolvido num mistério, num fogo sem luz, numa sombra branda, num vento de um afago. Uma carícia vazia, um beijo oco, num fluxo inédito, desconhecido, desses terrenos do espírito. E algo muda.
Seria paixão? Creio que, antes, medo.
Uma ânsia perante o abismo, onde todo caminho acaba...
Acaba? não.
A queda é um vetor, uma seta, um caminho igual e oposto a tudo que existe... a tudo que se conhece.
E perceber que essa queda é o caminho é o passo vital. Pois, é preciso lembrar, o tempo arrasta sempre em frente, sempre em frente, sempre em frente, como uma máquina prestes a nos esmagar em suas engrenagens sujas e enferrujadas. É uma marcha comandada sem condecendência, sem compaixão.
É preciso uma saída! Mas não há portas.
É preciso vontade! Mas não se encontra desejo.
É preciso esperança! Mas não há saída.
Tem-se a impressão de que certas questões não se resolvem, nem exixtem para isso. Elas estão vagandopor aí: uma interrogação semresposta... e por um momento, me lembro: Como isso é bom!!!
Aquela chibata que fere, sangra e aflora. Mas cicatriza, amadurece e se torna alegria. É uma felicidade assim, pura e ingênua.
A instância da existência, que comporta tão bem esse peso e esse gozo, essa escolha e essa perda... essa tentação e esse desejo.
Acho que isso é viver
domingo, 28 de setembro de 2008
secular

as horas têm uma mania curiosa de passarem vagarosas no domingo...
não há nada que se possa esperar nessas tardes monótonas.
nem salvação, nem paz. é tudo uma comunhão estranhamente familiar entre tédio e energia.
algo que preso no peito, perversamente converte a libido em pecado, inalienavelmente.
nem a solidão é pura, nem a comunhão liberdade. é uma flutuação entre a carne e o espírito. uma vontade louca de estrapolar a tênue linha da abstinência. o prazer que invade a santidade e se espalha vadiamente pelos pêlos, pela nuca, pelos seios... e desce.
o inferno está coberto de confissões e falso arrependimento - pois não há porque se arrepender.
pende a luxuria vagarosa no relógio, a preguiça inabalável, o desejo quase mórbido de ater-se para sempre num segundo antes da fatídica segunda-feira... descobrindo que há espaço no tempo secular do domingo.
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
despropósito
um que tenha asas de tinta
e pernas de cobre e aço.
um que cante sem voz.
se quiseres um fado, te dou.
um com tinta de ácido
e sabor de morango.
um que é gozo e algoz.
se quiseres um fado, te dou.
um que vagueia manso
e termina tanto bruto.
um que desfaz a vida.
se quiseres um fado, te dou.
um que atormenta a hora
e suspende teu medo.
um fado chamado poesia.
segunda-feira, 15 de setembro de 2008
regras do jogo
algo que, como assim,
peguei pra mim.
não foi por mal
mas, às vezes, eu erro, sim.
mas, às vezes, não é assim,
todo eu que há em mim.
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à nós, Rafa.
e às (n/v)ossas Dissoluções Filosóficas
intuição n°1 [ imagens irremediáveis]
deve ser porque nunca se mede onde cuspir, nunca se pede o que cumprir. porque nunca se mexe. está ali.
deve ser porque de nenhum outro jeito seria, se não fosse exatamente como não é.
é o demônio no paraíso.
deve ser assim...
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inspirado em
Apenas Sinta.
*fui lá e me deu medo e sabor.
terça-feira, 9 de setembro de 2008
proibições n°4 [devaneios metafísicos]
não gosta nem não gosta, não ama, nem não ama.
nem alma, nem desalma.
nem lama nem pó.
a alma é roupa queimada e sem sujeira, limpa, mas faceira.
pronta a nos enganar, tomar posse e nos abandonar.
alma é pior do que puta!
proibições n°3[do bem]
mas assado, e não assim.
se fosse assim, seria fato fácil na vida por um fim. sem que ninguém se canse, ninguém se acuse ou cause descontentamento...
a vida sem felicidade seria muito mais feliz.
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*felicidade como compromisso último é pura falta de criatividade.
e de liberdade.
proibições n°2 [eu]
eu nunca nunca.
nunca.
segunda-feira, 1 de setembro de 2008
explicação para mudança abrupta de humor
algo invade o meu peito...
acho que é a felicidade
fazendo ronda
no terreiro.
mias
segundas intenções e uma péssima poesia
a malevolência do olhar
o fraco do vencedor
a vingança da sensibilidade lúdica
a pura vadiança das vizinhas
o suor escondido dos meninos
a pululança dos gemidos escorraçados
os segredos dos pais e dos filhos
eu sou desejo.
minha casa é a varanda
a sala a cama o mato o suspiro
a senzala e a casa-grande
o cristão o judeu o árabe e o ateu
a África e o mundo desde a Etiópia
a China e América e todo canto
que esvaece de gozo a cada instante
*dados estimam no mundo constantemente, a cada instante instante, uma média de 60.000.000 (60 milhões de pessoas) estão transando... O que você está esperando?? contribua para as estimativas continuarem altas!!
carta n° 9 [atrás de um momento]
aprenda a sorrir com os seus acasos, caro amigo. eles muito nos revelam sacanas e humildes comediantes de sentimentos, poesias, romantismo, sonho e desejo.
porque o acaso, é como papai noel: só existe se acreditamos nele. e acreditando nele, acreditamos em nós mesmo, nus e crus, na esperança de algo que quebra a monotonia de nosso destino grandiosamente indigente.
proibições n°1 [felicidade pode?]
nada além da verdade
pura e a priorística
de um ser definido
sem decisão.
há algo como o quê
de um destino incisivo
por baixo do poder
da vontade, fatalidade!
passivo a tudo,
à hora, ao inferno,
à lombriga na entranha,
na estranha condição
esta de estar vivo.
domingo, 31 de agosto de 2008
despejo
não ressurge, nem salva
está só e desgastada
no relento da relva.
foi
encoberta e sangrada
pelos degraus da escada do progresso.
regresso
e minha casa já não é
casa
não é linha
nem verso.
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
espectacula
agora! - e somente agora
ela está sincera.
e franca e fraca.
e na fraqueza, está bela.
então, olha!
como ela se despedaça
suavemente em olor de laranjeira
nessa brisa breve, em cor carmim.
vê que ela sublima, não anda.
evapora, não mais espera
se esvai pelos meus olhos,
a mim podre me abandona.
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
carta n°8 [mocinho e bandido]
gloreamos a seu desejo de sangue, de brutalidade, da sua monstruosidade redentora, que nos permite ir mais além do que nós mesmos, retrocedendo-nos, ao desejável nível de animais, e ao desejado posto de predadores indomáveis.
pobres e miseráveis mortais que somos, botamos um sonho pra lutar, violentar, massacrar, e engolimos toda a repugnância de nossa vida regrada, tediosa, previsível, mesquinha, humana.
só eles, os heróis, podem levar a glória de um assassinato, de uma vingança, de uma justiça, de um amor, de um sexo. afinal, eles é que batem, correm, vigiam, perdoam, esmigalham e fodem como ninguém. (e já aparecem com mocinha diferente no episódio seguinte... despedidas sem grande serimônia, nem flores, nem desculpas).
nossos hérois criminosos, hediondos e ridículamente exagerados. que não habitam o cume da imaginação humana, mas apenas o monte sagrado de seu desespero, guardado a sete torpes chaves de moral.
- nossa! porque tão aflito?
- sei lá... acho nunca vi ninguém chorando no funeral do bandido.
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porque o meu herói tá lá é pra meter porrada mesmo!!! hahahaha
fatabilidades
se não ris é por bobagem
se estas firme, há de cair
se estas morto, és passagem
se te alegras é por engano
se te sobra, é a fotaleza
se te falta, é mais leveza
se enalteces, és abandono
se há ruptura, és covarde
se meio dia, és alarde
se plenilúnio, és quimera
se partistes, assim quisera.
a visão à beira do infinito
como o concreto firme
sob os rígidos andaimes.
já não há rios nesses olhos
nem poeira, nem estrada,
nem salvação, nem caos.
e parecem ver estáticos
estrelas pontiagudas
que nunca sessam de brilhar.
nunca, nunca, nunca...
os meus olhos eternos
já estão cansados
de ver o mundo acabar.
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imagem: http://img5.travelblog.org/Photos/47789/224722/t/1741246-The-Eyes-Won-t-Leave-Me-1.jpg